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O Amor Constrói, a Paixão e o Ódio Arrasam Quarteirões

No grande conto de Guimarães Rosa, “A Hora e Vez de Augusto Matraga”, Nhô Augusto, cego pelo ódio, vai até a chácara de seu inimigo Major Consilva em busca de vingança. Seus ex-capangas, agora comandados por Consilva, aplicam um brutal espancamento em Augusto. Guimarães Rosa descreve de forma brilhante como Augusto se dá conta de sua desventura.

“E Nhô Augusto fechou os olhos, de gastura, porque ele sabia que capiau de testa peluda, com cabelo quase nos olhos, é uma raça de homem capaz de guardar o passado em casa, em lugar fresco perto do pote, e ir buscar na rua outras raivas pequenas, tudo para ajuntar à massa-mãe do ódio grande, até chegar o dia de tirar vingança.”
Guimarães Rosa com sua esposa Aracy de Carvalho e seus gatos

Já ouvi muitas vezes que o contrário do amor é o ódio. Em minha opinião, o contrário do ódio é a paixão. E o contrário do amor seria o desamor ou a indiferença.

A paixão é um sentimento extremo de simpatia. Quando estamos apaixonados, não enxergamos os defeitos do objeto da nossa paixão. Por outro lado, o ódio é um sentimento extremo da antipatia. Qualquer coisa que vier do objeto do nosso ódio servirá para alimentá-lo, independentemente da sua natureza. Esta antipatia é tão grande no ódio que a rejeição é feita a priori, sem qualquer tipo de análise, como disse Oswald de Andrade sobre um romance de José Lins do Rego:

– Não li e não gostei!

Oswald de Andrade, quadro pintado por Tarsila do Amaral

Ninguém deveria tomar decisões importantes, quando está ardendo em um dos dois extremos.

Por exemplo, ninguém deveria casar, quando está apaixonado. Para uma união funcionar, deve haver amor! Os bons momentos do relacionamento devem ser gostosos como um banho morno depois de um dia difícil. A paixão é uma fogueira que tudo consome. Após extinguir as chamas, muitas vezes, as diferenças são irreconciliáveis e a paixão transmuta-se em ódio, acendendo uma nova fogueira.

A regra vale também para o ódio. Sempre que tomamos uma decisão importante motivados pelo ódio, as perdas podem ser muito importantes, talvez irreversíveis. Quando se age como os ex-capangas de Matraga e guarda-se os pequenos ódios “para ajuntar à massa-mãe do ódio grande”, a consequência, provavelmente será desproporcional.

Nosso país, atualmente, vive uma ruptura causada por parcelas expressivas da população apaixonadas por um lado que odeiam o outro lado. A racionalidade foi deixada de lado e os ódios são realimentados. O viés da confirmação é o modelo mental mais empregado, onde o que não confirma o credo é abandonado ou, pior, hostilizado. Quaisquer postagens absurdas de WhatsApp ou Facebook são compartilhadas se estiverem alinhadas com o próprio pensamento.

Viver na paixão ou no ódio não é saudável. Devemos buscar o equilíbrio, a virtude aristotélica, longe dos extremos. Eu sei que, muitas vezes, não é uma missão fácil, mas é a única forma de se sentir pleno com paz de espírito.

Aristóteles
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Eu Sou um Homem Rico

Guardei a mala e a mochila no bagageiro sobre meu assento no avião. Tirei o tênis e coloquei aquela meia que vem no nécessaire das companhias aéreas. Acomodei-me na poltrona e resolvi conferir quais eram as opções disponíveis de filmes. Escolhi “Captain Phillips” como primeiro filme da noite, esperando mais uma convincente atuação de Tom Hanks. A surpresa ficou com seu antagonista no filme, o somali Barkhad Abdi.

Capitão Phillips

“Captain Phillips” com Tom Hanks e Barkhad Abdi

Antes de o filme começar, passou um comercial do Bank of Singapore. Você pode assisti-lo abaixo.

Realmente, não há nada mais precioso em nossas vidas do que os relacionamentos que mantemos com as pessoas ao nosso redor, mas não é fácil se dar conta disto. Enquanto a moça da Columbia Pictures aparecia com aquela pose de Estátua da Liberdade, eu cheguei a uma importante conclusão:

– Eu sou um homem rico!

Mais importante do que casas, apartamentos, automóveis e investimentos que pudessem fazer parte do meu patrimônio, tenho três filhos e uma esposa que amo muito e que me amam. Todo o dia tenho uma troca intensa com eles e a cada reencontro parece que tudo se renova, me sinto feliz!

No ano passado, fiz um curso sobre finanças no INSEAD da França. A primeira parte do curso poderia ser resumida em três frases simples em inglês:

Cash is king!

Time is queen!

Risk matters!

Ou seja, o caixa é o rei, o tempo é a rainha e o risco importa. Os investidores procuram projetos que tornem o fluxo de caixa da empresa mais positivo do que projetos apenas lucrativos. Manter o fluxo de caixa positivo conserva a saúde da empresa. O tempo é importante, porque, ao comparar diferentes projetos, devemos trazer suas contribuições ao caixa da empresa para o tempo presente, para o dia de hoje. Finalmente, sempre que investimos em alguma coisa, olhamos para o retorno e para o risco associados ao investimento.

Paradoxalmente, pela minha nova definição de homem rico, o caixa deve estar sempre praticamente zerado. Devemos retornar tudo o que recebemos o mais rápido possível. Isto não significa que os fluxos de entrada e saída sejam pequenos, pelo contrário devemos circular grandes volumes de amor, carinho e compreensão. Vamos ser mais perdulários do que a caricata figura do “rei do camarote”, mas ao invés de focar nos bens materiais, vamos prestar atenção aos sentimentos.

O "rei do camarote"

O “rei do camarote”

Para finalizar, lembro-me de um presente que meu filho Léo me deu há um bom tempo, o saco do carinho. Estava escrito assim:

– Carinho – quanto mais se dá, mais se tem!

Este parece um daqueles círculos virtuosos. Quanto mais a gente dá e demonstra afeto, mais recebe, mais feliz e autoconfiante fica, mais a gente dá, mais recebe…

Como eu apresentei antes, a nova lógica é sempre devolver, no mínimo, tudo o que se recebeu e nosso “caixa” ficará zerado, mas nossos corações ficarão cada vez mais plenos em felicidade e alegria.

Foto da minha família (São Paulo, julho de 2013)

Foto da minha família (São Paulo, julho de 2013)

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