Os soldados feridos foram transportados para a Blue Spaceship. A colônia foi cercada, e as buscas começaram de casa em casa. Um dos oficiais da força de paz da ONU foi abordado por uma mulher visivelmente nervosa que queria saber o que houve na sede do conselho. O oficial contou que, quando os soldados invadiram o prédio, bombas incendiárias explodiram e todos que estavam dentro morreram. A mulher caiu de joelhos, e começou a chorar e disse que seu marido era um dos seguranças. O oficial consolou-a, mas procurou obter mais informações:
– Meus pêsames! Com certeza, seu marido não queria estar naquele prédio com apenas mais um colega…
– Não, eu até preferi que ele ficasse lá do que no meio da floresta, com os conselheiros e os outros seguranças. Achei que ele e o colega se entregariam e ficaria tudo bem, mas…
– Em qual floresta estão os outros?
– Na floresta da fonte da juventude.
O oficial desejou que a mulher se recuperasse da perda de seu marido e pediu ao soldado, que o acompanhava, a ajudasse no que fosse necessário. Em seguida, despediu-se e relatou imediatamente sua descoberta ao líder da operação. A tropa se reuniu e avançou até a floresta.
As sentinelas do conselho de Perennial entraram em combate com os primeiros soldados invasores da floresta. Ambos os lados sofreram baixas; contudo, a força de paz da ONU, mais numerosa e bem treinada, avançou rapidamente até o prédio onde o conselho do planeta estava escondido. Dessa vez, os soldados explodiram uma parede lateral para entrar no prédio. Quando chegaram à sala onde estava o conselheiro-mor, um soldado mirou em seu corpo e gritou para que ele se entregasse. O conselheiro-mor respondeu à ordem:
– Você quer me levar para a Terra como um troféu? Como a cabeça empalhada de um animal selvagem morto por um caçador em um daqueles antigos safáris na África? Todos nós já estamos mortos!
O soldado, assustado, disparou sua arma laser contra o peito do conselheiro-mor que, agonizando, apertou o botão do controle que estava em sua mão direita, acionando uma bomba térmica. A temperatura em toda a região da floresta da fonte da juventude superou os 3.000°C. Toda a vida da floresta foi destruída — nenhum humano, kwasha, inseto ou planta resistiu.
A notícia gerou uma enorme comoção na Terra, afinal, dezenas de pessoas morreram. Além disso, a possibilidade de vida eterna foi inviabilizada com a destruição total da floresta da fonte da juventude.
No dia seguinte à tragédia, o secretário-geral convocou a imprensa para um comunicado oficial na sede da ONU. Bilhões de pessoas aguardavam ansiosamente o seu pronunciamento. No horário marcado, ele chegou ao plenário lotado, esperou que as autoridades e os repórteres se acomodassem e iniciou seu discurso:
– Há pouco mais de dois anos, uma incrível descoberta encheu a humanidade de esperança. As sementes de uma planta encontrada no planeta Perennial, apelidada de fonte da juventude, interrompiam o envelhecimento celular. Foram realizadas inúmeras tentativas de isolar o princípio ativo, sem sucesso. Tentou-se também cultivar a fonte da juventude, empregando as mais modernas técnicas agrícolas, mas as plantas resultantes não possuíam as mesmas propriedades. Decidiu-se, então, coletar suas sementes de forma controlada e distribuí-las aleatoriamente entre a população humana da Terra e das colônias espaciais.
– Os membros do conselho de Perennial sugeriram que fossem empregados para esta tarefa de coleta dóceis animais do planeta Arborea, os kwasha-kwashas. Essas pobres criaturas foram escravizadas, e nós permitimos isso devido à cegueira causada pela possibilidade da vida eterna. Será que a vida de um humano vale mais do que a de um kwasha?
– Posteriormente, os conselheiros de Perennial passaram a desviar as sementes para obter vantagens pessoais. Chegaram ao ponto de sequestrar e manter em cativeiro uma equipe da ONU que investigava o caso. Houve intransigência tanto por parte do conselheiro-mor de Perennial quanto da minha. Todos estavam cegos pela fonte da juventude.
– Em vez de diálogo ou negociação, partiu-se para um confronto sangrento. Eu deveria ter percebido que nossa vantagem poderia acuar os conselheiros de Perennial. Ao sentirem-se sem saída, partiram para atos extremos. A floresta que abrigava a fonte da juventude foi totalmente destruída por uma bomba acionada pelo conselheiro-mor de Perennial, em um momento de completo desespero. Eu errei! Meu erro causou a morte de mais de uma centena pessoas. Meu erro gerou o genocídio de aproximadamente dois terços da população de kwashas. Meu erro deve ter exterminado inúmeras espécies de plantas e animais que só existiam naquela floresta. Meu erro acabou com a única forma conhecida, até agora, de paralisar o envelhecimento dos homens.
– Hoje, penso que a fonte da juventude pode ter sido um teste que uma Entidade superior deste Universo fez conosco, humanos. Em vez de ouro ou pedras preciosas, foi-nos oferecida a vida eterna; mas, como não havia o suficiente para todos, não soubemos como compartilhar. Não demonstramos solidariedade nem compaixão! Deixamos aflorar nossos instintos mais vis: a ambição, a ira, a vingança. O sinal de alerta foi a permissão para escravizar os kwashas. Nenhuma maravilha pode ser construída sobre as bases da dor e da exploração. Só uns poucos lutaram contra a barbárie cometida contra aqueles animais inocentes. Devemos aprender a lição e não repetir mais estes erros. Espero que o dia de ontem seja lembrado, como a explosão da primeira bomba atômica, em Hiroshima, foi lembrada durante muito tempo, como algo que não deve se repetir.
– Finalizo, renunciando ao posto de secretário-geral da ONU. Espero que um ser humano melhor, mais equilibrado, me suceda. Estou à disposição para receber a punição que acharem justa. Agradeço a atenção de todos.
A reação de todos que ouviram o pronunciamento do então ex-secretário-geral da ONU foi de profundo silêncio. Todos sabiam que ele não era o único culpado; muitos também erraram por omissão. Aquela tragédia serviu, pelo menos, para mostrar que a construção da humanidade ainda não estava completa e que todos deveriam permanecer vigilantes, pois nada poderia justificar as práticas adotadas no célebre caso da “fonte da juventude de Perennial”.



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