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Como Melhorar a Circularidade dos Bens de Consumo Rápido

Uma das áreas de ação da economia circular é formada pelos chamados bens de consumo de movimento rápido (FMCG – Fast-Moving Consumer Good). Dentro desta categoria de produtos não duráveis, podemos listar os alimentos frescos ou congelados (frutas, legumes e castanhas), os alimentos processados, as refeições prontas, as bebidas (águas engarrafadas, refrigerantes, cervejas e sucos), os produtos de panificação, os medicamentos vendidos sem receita médica (aspirina, analgésicos e outros), os produtos de limpeza, os cosméticos e os produtos de higiene pessoal.

A maior parte dos alimentos existentes no mercado atualmente sofrem, pelo menos, alguma forma de processamento. Muitas matérias primas são refinadas e as substâncias removidas tornam-se resíduos. Muitos dos materiais descartados ainda possuem valor nutricional. Em outros casos, o alimento integral apresenta características nutricionais melhores do que o alimento refinado.

Minha proposta tem quatro eixos.

1. Estudar o processo produtivo a fim de reduzir a geração de coprodutos e resíduos

O aumento da eficiência do processo traz benefícios econômicos, sociais e ambientais. A quantidade de matéria prima por unidade de produto produzido é reduzida, diminuindo as emissões de poluentes e resíduos enviados para aterros. Como existe um benefício econômico claro, a empresa pode criar um programa para focar na redução das perdas através de ferramentas como, por exemplo, Six Sigma, Lean Manufacturing e Kaizen. Normalmente esta alternativa apresenta várias ações de curto prazo de fácil execução (os chamados low hanging fruits em inglês) que trazem resultados rápidos para a empresa.

2. Encontrar aplicações para os coprodutos gerados no processo

Muitos resíduos tornam-se efluentes líquidos que exigem, muitas vezes, estações de tratamento caras e complexas. Estes custos devem ser considerados no preço de venda do produto. Se este material for aproveitado pela própria empresa ou comercializado para ser matéria prima de outra indústria, o custo final será reduzido, trazendo benefícios econômicos, sociais e ambientais. Esta alternativa exige desenvolvimento de processo ou, até mesmo, redesenho total do processo produtivo. Um exemplo deste tipo de abordagem é o aproveitamento do soro de leite proveniente da produção de queijo que apresenta uma série de aplicações na indústria de alimentos. Antes do desenvolvimento deste produto, o soro do leite causava poluição hídrica devido à sua alta concentração de matéria orgânica e de nitrogênio. Algumas empresas localizadas em zonas rurais usavam o soro como parte da alimentação de suínos.

Laticínios – leite, queijos e soro (abaixo à esquerda)

3. Criar linhas de produto integrais ou minimamente processados

A melhor alternativa seria colocar no mercado alimentos minimamente processados, onde seria garantido a ausência de patógenos, metais pesados e demais substâncias tóxicas. Estes produtos deveriam ser desenvolvidos desde os produtores de matérias primas até o consumidor final. Assim o desenvolvimento envolve toda a cadeia de valor da empresa. Existem diferentes tipos de leguminosas (feijões, lentilhas e grão de bico) e cereais que podem servir de alimento com mínimo processamento. Este terceiro item da proposta está alinhado com o movimento pelo “clean label” que busca por produtos apenas com ingredientes “reconhecíveis” pelo consumidor. A empresa que buscar este mercado pode viabilizar uma melhor remuneração para pequenos e médios agricultores, prover alimentos nutritivos aos consumidores, com menor impacto ambiental. Por causa do reconhecimento da sociedade, pode operar com margens maiores, trazendo sustentabilidade econômica para si e para toda a cadeia.

Diferentes tipos de feijões, ervilhas, lentilhas e grão-de-bico

4. Minimizar a quantidade de embalagens e facilitar a reciclagem

Os bens de consumo de movimento rápido (FMCG) também são conhecidos como bens de consumo embalados (CPG – consumer packaged goods). As embalagens são fatores muito importantes no processo de produção e, normalmente, são classificadas como primária, secundária e terciária.

A embalagem primária está em contato direto com o produto. Além de protegê-lo, apresenta informações importantes para os consumidores, como data de fabricação / validade, instruções de uso, lista dos ingredientes, dados nutricionais e presença de alergênicos.

Em alguns casos a embalagem primária não apresenta estas informações, sendo necessária uma embalagem secundária, geralmente de papel cartonado. Nestes casos, há aumento no volume de resíduos. Pigmentos coloridos e polímeros podem dificultar a reciclagem do material.

Os sistemas de logística e distribuição geralmente exigem embalagens secundárias e terciárias para maximizar a eficiência de estocagem, transporte e distribuição. Normalmente estas embalagens são de papelão ou filmes plásticos.

Seria fundamental ao projetar a embalagem pensar em dois fatores: facilidade de reciclagem e logística reversa. Embalagens multicamadas, por exemplo, possuem processos de reciclagem mais complexos e custosos.

[Packaging]

Embalagens primárias, secundárias e terciárias

No próximo artigo, aprofundarei esta abordagem no caso dos alimentos orgânicos.

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O Projeto não Deve Começar pela Solução do Problema

Quantas vezes não passamos por situações como esta que descreverei a seguir? O gerente de produção entra na sala do gerente de engenharia e diz:

– Precisamos comprar uma máquina nova. As três que trabalham em paralelo hoje não darão conta da produção prevista pela área comercial.

O gerente de engenharia pode simplesmente abrir uma base de dados e digitar o título do novo projeto:

– Aquisição e instalação da máquina 4 da linha de produção X.

Na sequência o gerente de produção deveria digitar a justificativa, benefícios, prazo, etc.

Comprar e instalar um novo equipamento em uma fábrica existente que não pode parar, geralmente, não é uma tarefa simples ou barata. Talvez nem seja esta a melhor alternativa, pois, na verdade, o título do projeto deveria ser:

– Aumento da produção da Linha X em 30%.

Neste caso, as possibilidades de análise seriam mais amplas. Poder-se-ia começar pelo cálculo da Eficiência Geral do Equipamento (OEE em inglês).

Assim estaríamos levando em consideração três aspectos da operação dos equipamentos atuais:

– Disponibilidade – setups, quebras, manutenções não-previstas, falta de matéria prima;
– Desempenho – pequenas paradas, redução de velocidade;
– Qualidade – retrabalhos, rejeitos, sucatas.

A figura abaixo apresenta um exemplo.

Cálculo da Eficiência Geral do Equipamento

Neste exemplo, a disponibilidade do equipamento é de 80% devido às manutenções imprevistas, a produção média horária é de 70% da capacidade nominal provada do equipamento e o índice de produto dentro da especificação é de 90%. A expressão matemática que calcula a OEE está apresentada abaixo:

OEE % = [Disponibilidade %] x [Desempenho %] x [Qualidade %]

No nosso exemplo, a OEE seria de aproximadamente 50%. Ou seja, para aumentar em 30% a produção não deve ser necessário investir em um novo equipamento, pode-se atingir ao objetivo trabalhando na melhoria destas três dimensões apresentadas acima: disponibilidade, desempenho e qualidade.

Mas, muitas vezes, não é fácil mudar a cabeça do solicitante de um novo projeto, pois ele está convicto que esta é a forma de solucionar um determinado problema. O que podemos fazer nesta hora. Existem diferentes técnicas para quebrar as barreiras. Uma das mais simples e poderosas é a dos “5 porques”.

Nossos filhos praticam a técnica dos “20 porques” por vezes com o objetivo de atrasar o início de uma tarefa doméstica.

Nosso objetivo, ao aplicar esta técnica, é chegar à causa raiz, mas cuidado com as respostas circulares…

Abaixo tem a aplicação da técnica relativa ao exemplo desenvolvido neste post.

P1.  Por que devemos comprar mais uma máquina?
R1. Porque nossa produção atual está abaixo das necessidades da área comercial.

P2.  Por que a produção está abaixo do necessário?
R2. Porque não conseguimos trabalhar na capacidade nominal dos equipamentos.

P3.  Por que não se consegue trabalhar na capacidade nominal?
R3. Porque aumentam as quebras e o percentual das peças fora de especificação.

Nem chegamos à quinta pergunta e já temos boas informações para iniciar a investigação. O próximo passo é estratificar as causas e determinar a importância de cada uma delas. Um Diagrama de Pareto é uma ferramenta simples e prática para priorizar as principais causas.

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Como Fugir da Maldição do Gráfico de Dente de Serra e Manter as Melhorias no Processo

Temos um problema de processo. Um grupo se reúne e encontra a solução. Na semana seguinte, o desempenho é medido e, para a alegria deste grupo, tem-se um resultado excelente. Mensagens com congratulações circulam pelo e-mail da empresa e a vida prossegue.  Passa um tempo e alguém se lembra de dar uma olhadinha para ver como está funcionando aquele processo e tem uma surpresa! O desempenho voltou para o nível anterior àquela intervenção. Neste momento, pode-se perguntar para um operador o que está acontecendo e a resposta será desconcertante:

– Sempre foi assim! Isto nunca funcionou muito bem mesmo…

Neste caso, pode-se simplesmente repetir o que foi feito anteriormente e voltar a colocar o processo nos trilhos.

O gráfico de dente de serra apresentado abaixo será uma rotina nesta empresa e os resultados não serão sustentáveis. 

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Gráfico de Dente de Serra

Mas como os resultados podem ser sustentados?

O primeiro ponto é o comprometimento genuíno da gerência da área. O gerente deve acreditar e adotar a solução como sendo sua. Ele deve liderar pelo exemplo. Todo o processo de mudança encontra obstáculos. A maior barreira é a reatividade das pessoas. Para conquistá-las, melhor seria a participação na solução do problema, mas, se isto não for possível, devem ser treinadas e conscientizadas sobre a importância da mudança.

A base para o treinamento é a criação e atualização de padrões e procedimentos. Taiicchi Ohno disse que onde não existem padrões não pode haver melhoria contínua. Claro que a maioria das pessoas não gosta de redigir procedimentos e para se justificar costumam dizer:

– Pessoas não são robôs! Elas têm que ter espaço para usar a criatividade.

Na verdade, um procedimento descreve a melhor forma conhecida e comprovada de fazer certa atividade. Se cada um usar seu livre arbítrio e executar uma tarefa de acordo com sua fórmula pessoal, o resultado final terá uma variabilidade desastrosa. A disciplina operacional é chave para que todos trabalhem de modo padronizado. Sempre existirá o momento para usar a criatividade, mas as melhorias serão efetuadas a partir dos standards estabelecidos.

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Taiicchi Ohno

Também é fundamental a definição de parâmetros mensuráveis para avaliar o desempenho do processo. Como todos costumam dizer “você não pode controlar o que não mede”. A divulgação dos indicadores do processo em quadros de gestão à vista ajuda a sustentá-los.

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Quadro de Gestão à Vista

O melhor mesmo é estimular a participação dos funcionários. O envolvimento do pessoal do chão de fábrica, incluindo operação e manutenção, durante a resolução de um problema, cria comprometimento para a manutenção dos resultados. A gerência deve criar as condições necessárias para maximizar esta participação.

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Todos Conhecem as Sete Perdas, mas Quem se Importa com a Oitava?

Muda é definida no Sistema Toyota de Produção como qualquer atividade que não agrega valor ao processo. As sete categorias de perdas são bem conhecidas por todos.

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Defeitos geram sucatas e retrabalhos. O resultado final pode afetar diretamente o cliente devido ao atraso no recebimento do produto.

Superprodução é simplesmente produzir mais do que o cliente comprou. O resultado é o aumento desnecessário dos estoques.

Transporte de produto sempre é um desperdício de tempo. Além disto, aumenta o risco de perdas.

Espera custa dinheiro. Isto vale tanto para produtos quanto para pessoas.

Estoques de produtos, matérias primas e materiais de consumo oneram os custos financeiros da empresa.

Movimentação de pessoas e equipamentos para a realização de uma etapa do processo ou tarefa não agrega valor ao produto.

Excesso de processamento gera trabalho adicional que o cliente não pediu e não pagou.

Além destas sete categorias listadas acima, existe uma mais perversa. Esta oitava categoria pode ser a causa principal das anteriores: a subutilização das pessoas.

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Encontramos funcionários não engajados por vários motivos como, por exemplo, desmotivação, falta de treinamento, limitação de autoridade ou responsabilidade, controle excessivo da gerência e falta de disponibilidade de ferramentas gerenciais adequadas.

Neste estado, as pessoas passam a aceitar as perdas dos processos como sendo normais, não buscando melhores níveis de desempenho.

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Pasta de Dente e o Ventilador: Como Acelerar as Mudanças na sua Empresa

Na Internet, pode-se encontrar facilmente o vídeo de uma história contada pelo filósofo e doutor em educação, Mario Sérgio Cortella, sobre um problema de caixinhas vazias de pasta de dente de uma grande empresa multinacional. Assista ao vídeo.

Nós engenheiros temos certa resistência para aceitarmos soluções pouco elegantes ou que não estejam alinhadas com o estado da arte da tecnologia. Qualquer engenheiro que fosse consultado sobre o problema da rejeição das caixinhas vazias de pasta de dente sugeriria a solução adotada pelos colegas. Ou seja, haveria um check weigher no final da linha de produção, composto por uma balança, sistema computadorizado de controle e um braço mecânico para a remoção das caixas com peso abaixo do especificado.

Exemplo de Check Weigher

Exemplo de Check Weigher

Muitas vezes as decisões são tomadas dentro de um escritório sem a participação das pessoas diretamente envolvidas na operação.  No caso desta discussão, dois engenheiros receberam uma missão e buscaram a melhor solução técnica disponível no mercado. Operadores e funcionários da manutenção provavelmente não forma envolvidos. Como resultado final obteve-se um sistema que atendia o objetivo, mas era mais complexo, bem mais caro e menos prático do que o adotado pelos operadores. Além disto, foram necessários três meses para solucionar o problema.

Existem inúmeras técnicas para acelerar a implementação de melhorias de processo. Uma das ferramentas mais poderosas que eu conheço e emprego é o chamado evento Kaizen. Monta-se uma equipe multidisciplinar integrada por operadores, engenheiros, gerentes, membros da manutenção e pessoas de outras áreas. Esta equipe, com no máximo dez pessoas, é conduzida por um facilitador, conhecedor de técnicas Lean. Após um breve treinamento nas técnicas a serem utilizadas, realiza-se uma visita na área problema. Na sequência, é feito um brain storming (o nosso toró de palpite). Todas as ideias levantadas são discutidas e classificadas de acordo com seu impacto e dificuldade de execução. Definem-se todas as ações a serem implantadas e testadas nos dois dias seguintes, bem como os seus responsáveis. Em menos de uma semana e com baixo custo, melhorias significativas são obtidas.

Como disse o filósofo Mario Sérgio Cortella, a melhor solução está no estoque de conhecimento da empresa. Para explorar este valioso estoque, nada melhor do que juntar pessoas que podem colaborar na solução do problema e dar a mesma oportunidade de expressar suas opiniões.

Finalmente devemos ter sempre em nossas mentes que primeiro temos que compreender para depois sermos compreendidos.

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