Arquivo da tag: culpa

Acolhendo Nossa Criança Interior

No final de maio deste ano, a Claudia promoveu um workshop especial sobre a criança interior no nosso espaço. A proposta era simples e, ao mesmo tempo, profunda: ouvir as vozes sutis (ou às vezes barulhentas) que vivem dentro de nós desde a infância. Foi um convite ao reencontro com nossa essência mais autêntica, nossos medos, tristezas e raivas antigos, além da nossa capacidade de brincar com a vida de forma leve e autêntica. Tudo isso em meio a trocas sinceras, lágrimas, acolhimento e olhos brilhando. E ali, mais uma vez, ficou claro que atrás de muitos dos nossos conflitos do dia a dia, está o velho conhecido ego.

O ego, essa parte da personalidade que quer manter o controle, ser reconhecido, ter razão e proteger-se a qualquer custo, nos guia com frequência mais (e de forma diferente) do que gostaríamos. Ele constrói máscaras, reforça padrões automáticos e, quando ferido, reage como uma criança! E é aí que entra a beleza do trabalho com a criança interior: reconhecer que dentro de cada um de nós habitam várias vozes infantis, com necessidades legítimas, mas frequentemente inconscientes.

Eu Adulto com suas Crianças Interiores

A “Criança Livre” é a que corre descalça no campo das ideias e emoções. Ela ri alto, inventa soluções, brinca com espontaneidade, dança sem música e ama com o corpo inteiro. O Eu Adulto pode abraçá-la, canalizando sua leveza e criatividade, mas também ajudando-a a saber a hora de repousar e respeitar limites.

Já a “Criança Adaptada” é moldada por exigências externas. Pode ser submissa, ressentida ou culpada. Muitas vezes diz “sim” querendo gritar “não” — ou espera, em silêncio, que o mundo adivinhe suas necessidades. O Eu Adulto precisa estar atento, como um bom cuidador, ensinando a essa criança que é possível se expressar sem medo, colocar limites com afeto e buscar o próprio valor fora da aprovação alheia.

E há também a “Criança Rebelde”, que quando ferida ou desacreditada, grita, ironiza, faz birra ou se fecha em silêncio. Ela pode ser uma potência criativa ou uma sabotadora impaciente. Cabe ao Eu Adulto compreender sua dor e transformá-la em força de ação — não como quem castiga, mas como quem escuta e a guia com firmeza e ternura.

Nesse caminho, o Eu Adulto não é um juiz, nem um pai severo. Ele é um guardião interno — aquele que observa, acolhe e age com consciência. Ele é quem consegue dizer “sim” com inteireza e “não” com serenidade. Olha para suas feridas sem julgamento; e para seus talentos, sem soberba.

Foi isso que vi no workshop da Claudia: adultos reencontrando suas crianças internas. Chorando memórias antigas, resgatando bons momentos esquecidos e, sobretudo, aprendendo a se escutar com mais compaixão.

Talvez este seja o maior desafio da vida adulta: crescer sem abandonar (ou querer matar) quem fomos. A maturidade não é enterrar a criança, mas oferecer-lhe um bom lugar no nosso coração.

Se você quiser viver essa experiência, haverá um novo workshop no dia 31 de agosto. Será uma nova oportunidade de escutar as vozes da sua criança interior.

Deixe um comentário

Arquivado em Ética, Ciência, Educação, Gestão de Pessoas, Inovação, linkedin, Psicologia, relacionamento, Saúde

A Copa do Mundo Envergonhada

Começou na semana passada a Copa do Mundo de Futebol no Brasil. Já ganhamos o primeiro jogo na nossa jornada rumo ao hexacampeonato! Infelizmente, estava no meio de um teste no Canadá e apenas pude ver os melhores lances do jogo à noite em um canal de esportes local.

Gol de empate de Neymar para o Brasil contra a Croacia [Fonte: site Globoesporte.com]

Gol de empate de Neymar para o Brasil contra a Croácia  [Fonte: site Globoesporte.com]

Mesmo em Saskatoon, tive a surpresa de ver o destaque da Copa na edição local do jornal Metro, considerando que o futebol tem pouca importância para a população local. No dia da estreia do Brasil, a capa era dedicada à Copa, além de mais uma página interna. No dia seguinte, havia mais uma página sobre a abertura e o jogo do Brasil; e outra, sobre os jogos de sexta-feira. Nos canais de esporte canadenses, a Copa dividia o tempo com as finais da NBA, da NHL (hóquei no gelo, o esporte nacional) e do U.S. Open de golfe. Realmente a Copa é um dos maiores eventos mundiais.

Poucos povos do mundo gostam de futebol como os brasileiros, mas nunca vi uma Copa do Mundo na qual os brasileiros estão tão tímidos ou mesmo envergonhados para torcer pela nossa seleção. Houve os tradicionais atrasos de obras, a malversação das verbas públicas, os desmandos da FIFA… Isto pode e deve nos trazer indignação, mas por que a vergonha em torcer pelo Brasil?

Lembro-me que no segundo grau se decidiu fazer uma peça com a versão em inglês do texto do “Pequeno Príncipe” de Saint-Exupéry. Eu recebi o menor papel de todos – o bêbado, porque provavelmente ninguém acreditava no meu talento dramático. O motivo da escolha do papel não foi certamente a minha identificação com o personagem, porque, naquela época, eu não consumia absolutamente nada de álcool. Leia a íntegra do capítulo XII abaixo.

Bebado_Pequeno-Principe

O planeta seguinte era habitado por um bêbado. Esta visita foi muito curta, mas mergulhou o principezinho numa profunda melancolia.

– Que fazes aí? Perguntou ao bêbado, silenciosamente instalado diante de uma coleção de garrafas vazias e uma coleção de garrafas cheias.

– Eu bebo, respondeu o bêbado, com ar lúgubre.

– Por que é que bebes? Perguntou-lhe o principezinho.

– Para esquecer, respondeu o beberrão.

– Esquecer o que? Indagou o principezinho, que já começava a sentir pena.

– Esquecer que eu tenho vergonha, confessou o bêbado, baixando a cabeça.

– Vergonha de que? Investigou o principezinho, que desejava socorrê-lo.

– Vergonha de beber! Concluiu o beberrão, encerrando-se definitivamente no seu silêncio.

E o principezinho foi-se embora, perplexo.

As pessoas grandes são decididamente muito bizarras, dizia de si para si, durante a viagem.

Vejo amigos, amantes absolutos de futebol, envergonhados de torcer pela nossa seleção. As pessoas estão com vergonha de botar bandeiras nas casas e carros. Lembro-me de outras copas realizadas fora do país – as ruas eram decoradas; postes e meios-fios pintados; população mobilizada.

A vergonha é um sentimento curioso, é muito diferente da culpa. A vergonha é baseada na frase:

– O que os outros vão pensar se descobrirem que eu fiz isto?

Ou seja, a vergonha não nasce do conflito entre uma ação e os valores da pessoa, como a culpa. A vergonha se origina nas convenções sociais ou regras religiosas, por exemplo.

Agora parece que o brasileiro que torcer pela seleção, estará apoiando o governo, a FIFA, o gasto excessivo com estádios, desvios de verbas, falta de investimentos em educação, saúde e infraestrutura. Como se a paixão por futebol tivesse algo a ver com isto? Para ajudar o pessoal a ficar “sem vergonha”, preparei o quadro abaixo que mostra que eleição para presidente e o resultado da seleção brasileira na Copa não tem relação.

Copa_Presidentes-Brasil

Quadro: Resultado do Brasil na Copa do Mundo e a eleição presidencial.

Como observamos no quadro acima, FHC foi o único candidato da situação vencedor de eleição em ano que o Brasil ganhou a Copa. Em 1994, o maior cabo eleitoral de FHC não foi o futebol pragmático da seleção de Parreira, certamente foi o sucesso do Plano Real. Em 2002, o Brasil conquistou o Penta no Japão, mas o candidato da situação, José Serra, foi derrotado por Lula.

Ao invés de ficar com esta vergonha depreciativa, devíamos lutar para melhorar o país. Devíamos fiscalizar ativamente os atos e as contas dos três poderes em todas as esferas do país. Devíamos pressionar os Legislativos para aprovarem as leis de nosso interesse, ao invés de ficar lamentando ou postando coisas sem o menor fundamento nas redes sociais. Se continuarmos na espera que os outros resolvam os problemas do Brasil, deveremos sentir culpa por nossa omissão, ao invés de vergonha em relação ao país.

Felizmente as crianças, com sua espontaneidade, estão fazendo os adultos a perderem a vergonha de torcer pela nossa seleção, porque “as pessoas grandes são decididamente muito bizarras”

9 Comentários

Arquivado em Ética, Esporte, Lazer, linkedin, Política, Psicologia